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Ecologia, Economia e Capitalismo: por um planeta sociodiverso e ambientalmente viável.

Rita de Cássia Fraga Machado

Professora de Filosofia e Ecofeminista.

O poder com o qual os sistema dominantes subjugam todos os outros torna-o exclusivista e antidemocrático. (Shiva, 2003)

Todos os dias, assistindo a ataques cruéis e violentos à humanidade, as mulheres, negras e pobres, junto com a Amazônia, têm sido as mais atingidas e exterminadas. A partir desse cenário, chamamos a filosofia, com suas contribuições teóricas, para a responsabilidade de contribuir para uma reflexão em torno da biodiversidade em rede e em comunidade. Nossa Amazônia requer isso, redes menos abstratas, mais cooperativas, dinâmicas e democráticas não autoritárias e não dogmáticas, que estejam atentas a todas as formas de vida, humana e não humanas, conforme aponta Sattler (2019). 

Hoje, exatamente hoje, assistimos o Pantanal pegar fogo matando diversas espécies e tornando a vida dos outros seres humanos insalubres, sem ar para respirar. 60 dias atrás vimos as enchentes e destruição do Rio Grande do Sul. A realidade é de completa e urgente crise climática no Brasil.

O avanço do capitalismo, como modo de produção dominante ocidental, foi desestruturando, com velocidade e profundidade variadas, tanto os fundamentos da vida material como os da vida imaterial, num primeiro estágio, ainda no início das revoluções europeias, quanto crenças e os princípios morais, religiosos, jurídicos e filosóficos em que se sustentava o antigo sistema e, atualmente,ele, o que chamamos de sofisticação do espírito capitalista, avança destruindo tudo que há possibilidade de vida comunitária e sem veneno. Vale lembrar que o capitalismo e sua lógica irreversível nega, anula e proíbe o que é sociodiverso

Essa economia, afirmam estudiosos, é uma economia madura. “O sistema capitalista é aquele no qual se aboliu da maneira mais completa possível a produção com vistas à criação de valores de uso imediato, para o consumo do produtor: a riqueza só existe agora como processo social que se expressa no entrelaçamento da produção e da circulação” (MARX. O capital, v. III, p. 573.)

Nesse sentido, a terra, a floresta, os rios, a água, os seres humanos são riquezas, são “expressas no entrelaçamento da produção e da circulação” e, nessa circulação, viram mercadorias, a serem comercializadas, vendidas e exploradas a qualquer preço. Aliás, o preço que a humanidade paga é a da total eliminação de um ambiente saudável à sua existência. Comemos todos os dias toneladas de agrotóxicos, alimentos advindos de solos “mortos”, e monocultura, que não respeitam nenhum sistema comunitário e diverso de produção. 

A ideia de que o capitalismo deveria estar subjugado à Ecologia não me parece confortável, sequer possível. Essa condição estaria no mesmo campo utópico que discutiu Rosa Luxemburgo sobre a revolução dos sistemas;nesse sentido, a questão é outra. Ao estudarmos as relações de nós mesmo com o meio, é importante apontarmos sobre a fundamental importância no que se refere à mudança de comportamento. Essa relação de respeito, aliás, de total respeito, integrada com a mãe natureza, já é uma prática milenar dos povos tradicionais.

A questão a pensar é: de qual maneira podemos produzir uma existência sem crueldade, sem uniformidades do saber e de produção? A ideia de progresso e de ciência caberia nessa proposta de pensar  a partir do conceito de diversidades as mentes? propondo um pensamento alternativo à monocultura? 

Essa necessidade real do atual modo de produção capitalista de exploração humana e não humana como fonte de lucro tem devastado, e dificilmente iremos resgatar se não começarmos agora sistemas naturais alguns especialistas dizem que é impossível a retomada do ambiente destruído. A Ecologia evolucionista diz que “nada faz sentido em biologia, se considerado fora do contexto evolutivo” (Theodosius Dobzhansky), seguindo a lei do mais forte. 

A socioecologia Comunitária aponta para a ideia de que existem relações entre as comunidades biológicas e entre os ecossistemas da Terra, a ecologia interacionista de ecossistema diz que os organismos da Terra não vivem isolados, interagem uns com os outros e com o meio ambiente com os outros seres vivos. Certo, mas qual delas consegue nos dar suporte teórico e prático para desconstruir as relações de opressão que há entre humanos e não humanos sobre a natureza? Qual delas consegue dar conta de embasar nossas reflexões em torno do que é a vida? O desafio está colocado, os esforços são necessários, a filosofia, a biologia, a educação, todas as áreas do conhecimento estão convocadas a se engajar na luta ecofeminista de cunho não cruel e anticapitalista. Porque,se de um lado existem os que insistem nas monoculturas, por outro, há as que lutam pela diversidade da vida em toda a sua complexidade.

Notas:

MARX. K. O capital, v. III. 

Sattler, Janine. Um projeto ecofeminista para a complexidade da vida. In: Eco feminismos: fundamentos teóricos e práxis interseccionais/Daniela Rosendo; Fábio A. G. Oliveira; Príscila Carvalho; Tânia Kuhen (org). _ Rio de Janeiro: Ape’Ku, 2019. 

SHIVA, Vandana. Monocultura da mente: perspectiva da biodiversidade e da biotecnologia. Tradução: Dinah de Abreu Azevedo. São Paulo: Editora Gaia, 2003. 

Rita de Cássia Fraga Machado é professora de Filosofia na Universidade do Estado do Amazonas no Campus Tefé (CEST/UEA), professora permanente no programa de pós graduação em Educação da UEA, estudou filosofia e doutorou-se em educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Seu estágio de pós-doutorado foi o estudo com mulheres de comunidades da região do médio Solimões, esse trabalho de pesquisa, existente ainda hoje, é seu trabalho militante e que a faz confessar-se Ecofeminista. É autora e organizadora de livros como Trabalho e Educação: para ir além (2015) pela editora da UEA; organiza e escreve na coletânia Estudos Feministas: Mulheres e Educação (2016; 2019) pela editora Liberts; e seu ultimo livro é o resultado da sua pesquisa de pós-doutorado intitulado Participação: interfases do Sul e do Norte (2019); e curadora da coleção As Pensadoras

 e-mail: rmachado@uea.edu.br