Fernanda Staniscuaski
Docente da UFRGS e coordenadora do Movimento Parent in Science
Maio costuma ser o mês das flores, das homenagens às mães, dos comerciais que aquecem nossos corações. E não me entenda mal: gostamos, sim, dos mimos e dos gestos de afeto. Mas, para além das flores, é preciso aproveitar este mês para falar de estruturas. Porque estruturas não se transformam com presentes simbólicos, mas com ações concretas e mudanças institucionais profundas.
Nos últimos anos, venho me dedicando a uma dessas transformações, à frente do Movimento Parent in Science (PiS): trazer à luz as desigualdades vividas por mães na ciência e na academia. Uma realidade historicamente tratada como questão privada, que se comprovou em nossos estudos, um problema estrutural, coletivo e, sobretudo, político. Com o PiS, construímos uma base robusta de dados e publicações que quantificam, em números e evidências, o que tantas mulheres relataram por décadas em silêncio: ser mãe e cientista no Brasil é conviver com barreiras invisíveis que atrasam, desviam ou encerram trajetórias promissoras.
Atuar no PiS tem sido um trabalho árduo, mas que já resultou em mudanças concretas. Em 2021, conquistamos a inclusão do campo “licença-maternidade” na Plataforma Lattes, permitindo que cientistas mães registrem pausas legítimas em suas trajetórias sem serem penalizadas por isso. A partir dos nossos dados, passamos a ser ouvidos por agências de fomento e instituições de ensino e pesquisa, que vêm, ainda que lentamente, revisando processos e editais para incluir ações específicas voltadas à equidade de gênero e à permanência de mães na ciência.
Nos últimos anos, também passamos a ocupar espaços institucionais de influência: integro o Grupo de Trabalho do Ministério da Educação voltado à construção da Política Nacional de Permanência Materna no Ensino Superior, que tem atuado na geração de dados e indicadores sobre maternidade na graduação e na pós-graduação, e o Comitê Permanente de Ações Estratégicas e Políticas para Equidade de Gênero e suas Interseccionalidades da CAPES. Foi deste último comitê que partiu uma das conquistas mais recentes: a inclusão da maternidade no documento de referência para a avaliação do sistema nacional de pós-graduação, publicada na semana passada pela CAPES.
Além disso, nossas pesquisas serviram de base para o edital inédito da FAPERJ, lançado em 2024, voltado especificamente ao apoio a cientistas mães. Um marco no fomento à ciência no Brasil e, esperamos, o primeiro de muitos.
Essas mudanças são marcos. Mas não encerram a luta. Pelo contrário, evidenciam o quanto ainda há a ser feito. Que neste maio, possamos celebrar as mães não apenas com flores, mas com reconhecimento real de suas contribuições. Que tenhamos coragem para remover as barreiras que ainda impedem tantas mulheres de florescer plenamente na ciência e na vida acadêmica. Porque não há equidade na ciência sem políticas de cuidado. E não há ciência sustentável sem mães cientistas.